Isadora Cohen
Victor Medeiros
Luísa Dubourcq
Publicado originalmente no JOTA
O acesso à internet é condição chave para que a população tenha acesso à informação. Uma ampla cobertura, com alta velocidade e preços acessíveis podem dinamizar economias por meio da conectividade entre pessoas, empresas, escolas, universidades e hospitais dentro e entre cidades, regiões e países. O resultado esperado é um processo virtuoso de aumento da produtividade dos trabalhadores e da melhoria das condições sociais, como o acesso a oportunidades nas mais diversas esferas.
Estudos para dados brasileiros apontam que a expansão do acesso à internet pode promover a redução da pobreza e da desigualdade de renda[1]. Esse efeito seria potencializado pela melhoria da qualidade do serviço prestado como, por exemplo, uma maior oferta de velocidade. A expansão do setor se torna ainda mais crítica no contexto das enraizadas desigualdades regional e de renda no país, em que se observa condições precárias de oferta, qualidade e acesso à infraestrutura nas regiões Norte e Nordeste e para a população pobre e periférica.
Alguns recentes casos brasileiros têm demonstrado resultados relevantes no setor de internet. Um deles se refere à Parceria Público-Privada (PPP) Piauí Conectado, contratada pelo Estado do Piauí em 2018 para construir, operar e manter uma extensa rede de fibra óptica de alta qualidade durante um período de 30 anos. O projeto consiste na conexão de centenas de unidades do Estado (como escolas, hospitais, delegacias, entre outros) e de aproximadamente 400 pontos de acesso gratuito à internet em espaços públicos dos municípios piauienses. Para isso, calcula-se investimentos da ordem de R$ 396 milhões.
No momento de assinatura da parceria, em 2018, o cenário da infraestrutura de internet no Piauí era precário. O estado era o 4º pior do país em termos de acessos de internet por habitante, e menos de 20% de seus municípios tinham internet de fibra óptica.
Com o intuito de mudar o cenário da internet no Piauí, foi lançada a primeira fase do projeto Piauí Conectado, executada entre 2019 e 2020, que incluiu 101 municípios. A segunda fase, com contrato assinado em 2021, incluiu os restantes 123 municípios do estado, e teve o mesmo propósito de universalizar o acesso à internet.
Após cerca de 5 anos da assinatura do contrato da PPP, todos os municípios do estado passaram a ser atendidos com internet, e praticamente a totalidade de sua população consegue acessar o serviço. Atualmente, o estado é o 1º no ranking de velocidade média contratada, com 313,48 Mbps.
A expansão do acesso à internet no Piauí pode ter colaborado para o desenvolvimento econômico e social do estado. No âmbito econômico, os investimentos no setor de infraestrutura geram empregos, renda e arrecadação de impostos. Diversos estudos estimam multiplicadores de emprego entre 8 e 16 para o setor, indicando que, para cada R$ 1 milhão investido se pode gerar entre 8 e 16 empregos diretos e indiretos.
No âmbito social, o projeto atua diretamente no fornecimento de internet de qualidade para escolas, hospitais e prédios da segurança pública estadual. Indiretamente, incluiu toda a população do estado ao disponibilizar acesso gratuito em locais públicos.
Nas escolas, o acesso à internet de qualidade é necessário para que as crianças tenham acesso a materiais escolares, consigam assistir aulas remotas e trocar informações com professores e colegas. Essa condição foi criticamente imposta durante pandemia de Covid-19, que exigiu ampla readequação das formas de ensino e aprendizado, e afetou especialmente aquelas crianças de famílias sem condições financeiras para arcar com serviços de internet e equipamentos como computadores e celulares.
Atualmente, quase a totalidade das escolas estaduais do Piauí possuem acesso à internet de alta qualidade. Antes do início do Piauí Conectado, porém, o cenário era de estagnação. Nos 3 anos anteriores à assinatura do contrato, houve uma expansão de 1,1 ponto percentual das escolas com internet.
Fonte: elaboração ICO Consultoria a partir de dados do Censo Escolar/INEP. Nota: As séries históricas das variáveis “acesso à internet para uso dos alunos” e “acesso à internet para uso nos processos de ensino de aprendizagem” têm início em 2019.
A partir de 2019, houve um crescimento gradativo em todos os indicadores de acesso à internet nas escolas. No âmbito global, observa-se um crescimento de 13 pontos percentuais das escolas com acesso à internet, universalizando o acesso à internet (99,59%) e à banda larga (98,55%) na rede de ensino público estadual. O acesso também tem sido expandido para o uso dos alunos (79,55%) e processos de ensino e aprendizagem (92,15%), tão importantes em um cenário onde crianças e professores foram forçados a estudar ou lecionar à distância.
A universalização da internet de alta qualidade pode estar gerando benefícios adicionais para as crianças beneficiadas. Dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) para o Ensino Médio, em que prevalecem as escolas estaduais, sugerem que os municípios atendidos pela PPP em sua primeira fase tiveram incremento maior no Ideb, em relação àqueles municípios do estado que ainda não haviam sido atendidos até 2021. A média da variação no Ideb (entre 2017 e 2019, ano de início da PPP, e entre 2019 e 2021)[2] para 62 municípios atendidos pela PPP foi de 0,51, enquanto para 44 municípios não incluídos na primeira fase a média foi de 0,34.
Outro exemplo em andamento, com características similares, se refere ao Projeto Infovia Digital do estado de Mato Grosso do Sul. O contrato, assinado em 2022, prevê a interligação dos 79 municípios e de todos os equipamentos das unidades públicas estaduais a partir da prestação de serviços de transporte de voz, dados e imagem, mediante construção, operação e manutenção de infraestrutura de rede de fibra óptica de alta capacidade. O projeto se encontra em fase de construção, com previsão de finalização da rede em dois anos. Caso a iniciativa tenha o mesmo sucesso do exemplo piauiense, pode-se esperar incrementos expressivos nos indicadores de conectividade digital do estado e benefícios socioeconômicos para a população sul-mato-grossense.
Os casos citados podem servir de exemplo para que outros estados e municípios do país desenvolvam sua infraestrutura de banda larga. A questão é particularmente relevante no atual cenário de prolongada estagnação econômica e crise fiscal, a qual exige aprimoramentos na alocação dos recursos públicos para a efetividade dos investimentos em infraestrutura, e da crescente importância da conectividade para o desenvolvimento econômico e social do país.
[1]https://valor.globo.com/opiniao/coluna/investimento-em-infraestrutura-e-combate-a-desigualdade.ghtml. [2] Uma vez que a PPP se iniciou em 2019, é provável que os efeitos da melhor infraestrutura tenham demandado tempo para maturar. Portanto, a inclusão dos anos de 2017, 2019 e 2021 é mais coerente.
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