Exigência de acreditação pelo INMETRO e o papel do agente na gestão dos contratos
Isadora Chansky Cohen
Luísa Dubourcq Santana
Publicado originalmente no JOTA
Nos últimos anos, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) tem alterado seu modelo regulatório, fortalecendo uma regulação mais discricionária e organizando a regulação dos diversos contratos de concessão rodoviária celebrados desde a década de 1990. O chamado RCR – Regulamento das Concessões Rodoviárias já deu origem a algumas normas publicadas e tem outras em processo de estudo e maturação. Um aspecto chama a atenção entre tantas inovações regulatórias: a exigência de que o verificador contratado para o apoio nos contratos de concessão seja acreditado como organismo de avaliação da conformidade, na forma de ato do INMETRO.
Por meio da Resolução nº 6.000, de 1º de dezembro de 2022, a ANTT aprovou a segunda norma do Regulamento (RCR-2), disciplinando bens, obras e serviços aplicáveis aos contratos de concessão rodoviária. Na esteira de outras medidas de uniformização regulatória, nos parecem bastante relevantes as previsões quanto à atuação dos verificadores independentes (embora a norma não os tenha nomeado “independentes”, talvez em alusão às discussões travadas no âmbito do TCU sobre o tema) nas concessões.
Em diversas passagens, o RCR-2 reforça a importância da atuação do verificador nas concessões rodoviárias federais, inclusive disciplinando que os seus relatórios finais serão disponibilizados anualmente no sítio eletrônico da agência. Esclarece, ainda – como já foi objeto de debate anterior nesta coluna – , que a contratação se dará pela concessionária, o que parece ser importante passo rumo à uniformização do tratamento do verificador nas concessões.
Em seu art. 202, a Resolução nº 6.000/2022 prevê que “a concessionária deverá contratar empresa especializada para atuar como verificador acreditado como organismo de avaliação da conformidade, na forma de ato do INMETRO, ou posterior regulamento aplicável, para aferir o cumprimento das obrigações contratuais.”
A referida exigência de acreditação pode acabar retirando o foco da importância do verificador independente para a boa gestão dos contratos de concessão e, inclusive, para potencializar os resultados do projeto. Embora tenha reconhecido e valorizado a adoção desta figura nas concessões, prevendo expressamente o verificador na norma, deveria a Agência também avaliar se a acreditação não acaba por desincentivar a expansão do instituto, criando um fluxo procedimental que demanda tempo e custos.
Além disso, ao exigir que o verificador seja acreditado conforme normas do INMETRO e da ABNT, deve a ANTT ter cuidado para não pressupor que a atividade de verificação seja padronizada, o que não corresponde à complexa realidade dos contratos de concessão que demanda flexibilidade e compreensão do contexto local de cada projeto.
Muito mais que um simples certificador de que as obrigações contratuais estão sendo cumpridas, o verificador independente deve ser visto como agente essencial para o bom funcionamento da engrenagem das concessões. Sua atuação é essencial para ajudar na composição de desafios na execução contratual, preenchimento de lacunas, integração entre Concedente, Concessionária e demais stakeholders para permitir que os serviços sejam prestados com qualidade, apoio na comunicação do projeto, entre tantas outras atribuições que em muito ultrapassam a simples verificação de processos – para o que a acreditação perante o INMETRO poderia ser, de fato, relevante.
Reforçando a interpretação que parece adotar a ANTT no sentido de que o verificador tem função predominantemente certificadora ou auditora das concessões, o art. 209 da mesma norma permite que, para fins de qualificação técnica nos chamamentos públicos para a sua seleção, seja exigida experiência em auditoria, certificação e perícia.
É absolutamente louvável e salutar o movimento feito pela ANTT para incentivar a uniformidade na regulação contratual por meio do RCR e, nesse passo, reconhecer o papel essencial do verificador na gestão contratual. É também um movimento importante na Administração Pública federal em razão da desconfiança e ceticismo que o TCU já manifestou sobre o instituto.
No entanto, ao associar a atividade do verificador a uma simples manifestação de conformidade de processos, exigindo-lhe acreditação perante o INMETRO, pode fazer com que a ANTT deixe passar a oportunidade de pautar o tema por sua real importância: mais que um simples acreditador de “meios”, o verificador tem papel relevante nos “fins” da concessão, agindo como o óleo na engrenagem contratual que permite uma melhor interação entre todos os stakeholders da concessão, em benefício da qualidade do serviço público prestado ao usuário, na ponta.
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