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Quem paga a conta da evasão?

O número expressivo de evasões de pedágios nas rodovias paulistas incrementa o debate sobre a alocação de riscos nas concessões rodoviárias e deve ser considerado pela ANTT.


Isadora Chansky Cohen

Ana Carolina Sette


Publicado originalmente no JOTA

Em levantamento realizado em 2022, a Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp)[1], que realiza a regulação e fiscalização de cerca de 11,2 mil quilômetros de rodovias concedidas, apurou a ocorrência de 2,9 milhões de evasões em pedágios em tais vias.

O número superou em 20,8% as evasões registradas em 2021 e em 45% as de 2019 (período pré-pandemia), o que representa um aumento de quase um milhão.

Além de causar espanto o fato de que oito mil veículos dia passam pelas praças de pedágio no estado de São Paulo sem pagar, o dado nos faz pensar, inevitavelmente, em duas questões: (i) a tendência é que no sistema free flow esse percentual seja ainda mais significativo; (ii) como promover uma alocação de riscos “justa” nos contratos de concessão.

A discussão se dá em momento oportuno: a expectativa é que em março próximo o sistema free flow entre em operação[2] na BR 101/RJ (Rio – Santos), no âmbito do Sandbox Regulatório[3] da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Além disso, está em discussão um novo modelo de alocação de riscos que a ANTT pretende adotar nas próximas concessões rodoviárias (Audiência Pública n. 13/2022).

Em relação ao free flow, o grande desafio é justamente o aumento da evasão em comparação com as cobranças manuais e automáticas em praças de pedágio habituais. Ao depender de ações por parte do usuário para a concretização do pagamento e ao não contar com barreiras físicas impeditivas, o risco de evasão nesse tipo de sistema de cobrança é aumentado.

Vale pontuar que a prática não é exclusividade brasileira. Países europeus que já utilizam o free flow há alguns anos enfrentam o mesmo desafio.

Em contratos que utilizam esse sistema ou que preveem a possibilidade de sua implantação, o compartilhamento do risco de evasão já pode ser observado tanto em âmbito federal como estadual.

No caso da citada BR 101/RJ (Rio-Santos), por exemplo, alocou-se ao Poder Concedente o risco pelos “impactos positivos ou negativos decorrentes da implantação de sistema de arrecadação de Tarifa de Pedágio na modalidade free flow, ou outro que venha a existir, inclusive o comprovado aumento de receita e de evasão decorrente da implantação desta modalidade (...)” (Cláusula 22.2.16 do Contrato). E na cláusula 22.1.2, estabelece como risco da Concessionária a “queda de Receita Tarifária em virtude da evasão de pedágio ou de recusa de usuários em pagar a Tarifa de Pedágio ou a Tarifa de Pedágio do Trecho Viúva Graça”.

No contrato da rodovia Piracicaba Panorama S.A. - PIPA[4], no estado de São Paulo, a previsão é semelhante à da BR 101/RJ. Na hipótese de implantação da modalidade de cobrança de tarifa free flow, o risco de evasão fica compartilhado entre o Poder Concedente e a Concessionária. No contexto de São Paulo, embora haja previsões em alguns contratos, o free flow ainda não foi implementado (embora haja um projeto pioneiro e piloto na região de Jaguariúna, denominado “Ponto a Ponto”).

Contratos de concessão de rodovias federais - casos da BR 364/365/GO/MG (Ecovias do Cerrado), BR 101/SC (Via Costeira), BR 153/414/080/TO/GO (Ecovias do Araguaia) - também preveem uma alocação de riscos compartilhada caso haja implantação do sistema free flow.

Por essa amostra e considerando o percentual de evasão de pedágio levantado pela Artesp no ano de 2022, parece pertinente que esse mapeamento realizado pela Agência paulista seja levado em consideração pela ANTT no âmbito da Audiência Pública n. 013/2022, recentemente prorrogada até o dia 31/01/2023.

Como o objetivo da Agência é justamente colher impressões e contribuições para a melhoria e adequação da alocação de riscos dos contratos de concessão de rodovias federais à realidade das situações vivenciadas – em especial, o compartilhamento do risco de demanda – o dado pode contribuir para a pauta ao servir como um norte para o tema, ainda que a partir de uma amostra estadual.

A inclusão de tal elemento no estudo pode repercutir diretamente na metodologia que está sendo pensada e debatida pela ANTT no que tange às bandas de compartilhamento do risco de demanda e, sobretudo, na ampliação da aplicação do uso de sistema free flow.




[1]https://g1-globo-com.cdn.ampproject.org/c/s/g1.globo.com/google/amp/jornal-hoje/noticia/2023/01/13/sp-tem-29-milhoes-de-evasoes-em-pedagios-de-rodovias-concedidas-a-iniciativa-privada-em-2022.ghtml

[2]https://www.gov.br/antt/pt-br/assuntos/ultimas-noticias/antt-e-ccr-riosp-iniciam-a-implantacao-do-primeiro-sistema-free-flow-em-rodovias-federais

[3] Criação de procedimentos para o funcionamento de um sandbox regulatório (ambiente regulatório experimental), em que o regulador pode ousar, errar, testar, rejeitar e reformular hipóteses, ajustar propostas e chegar mais rapidamente a soluções efetivas para os problemas regulatórios.

https://portal.antt.gov.br/resultado/-/asset_publisher/m2By5inRuGGs/content/id/3119150

[4] CLÁUSULA DÉCIMA NONA - ALOCAÇÃO DE RISCOS

DOS RISCOS DA CONCESSIONÁRIA

(...)

19.1. vi. Quedas de RECEITA TARIFÁRIA em virtude da evasão de pedágio, conforme estabelecido no presente CONTRATO, com exceção das hipóteses expressamente previstas;

DOS RISCOS DO PODER CONCEDENTE

19.2. xvi. Investimentos e impactos positivos ou negativos decorrentes da implantação de sistema de arrecadação de TARIFAS DE PEDÁGIO na modalidade FREE FLOW, ou outro que venha a existir;O número expressivo de evasões de pedágios nas rodovias paulistas incrementa o debate sobre a alocação de riscos nas concessões rodoviárias e deve ser considerado pela ANTT.

Isadora Chansky Cohen

Ana Carolina Sette

Em levantamento realizado em 2022, a Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp)[1], que realiza a regulação e fiscalização de cerca de 11,2 mil quilômetros de rodovias concedidas, apurou a ocorrência de 2,9 milhões de evasões em pedágios em tais vias.

O número superou em 20,8% as evasões registradas em 2021 e em 45% as de 2019 (período pré-pandemia), o que representa um aumento de quase um milhão.

Além de causar espanto o fato de que oito mil veículos dia passam pelas praças de pedágio no estado de São Paulo sem pagar, o dado nos faz pensar, inevitavelmente, em duas questões: (i) a tendência é que no sistema free flow esse percentual seja ainda mais significativo; (ii) como promover uma alocação de riscos “justa” nos contratos de concessão.

A discussão se dá em momento oportuno: a expectativa é que em março próximo o sistema free flow entre em operação[2] na BR 101/RJ (Rio – Santos), no âmbito do Sandbox Regulatório[3] da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Além disso, está em discussão um novo modelo de alocação de riscos que a ANTT pretende adotar nas próximas concessões rodoviárias (Audiência Pública n. 13/2022).

Em relação ao free flow, o grande desafio é justamente o aumento da evasão em comparação com as cobranças manuais e automáticas em praças de pedágio habituais. Ao depender de ações por parte do usuário para a concretização do pagamento e ao não contar com barreiras físicas impeditivas, o risco de evasão nesse tipo de sistema de cobrança é aumentado.

Vale pontuar que a prática não é exclusividade brasileira. Países europeus que já utilizam o free flow há alguns anos enfrentam o mesmo desafio.

Em contratos que utilizam esse sistema ou que preveem a possibilidade de sua implantação, o compartilhamento do risco de evasão já pode ser observado tanto em âmbito federal como estadual.

No caso da citada BR 101/RJ (Rio-Santos), por exemplo, alocou-se ao Poder Concedente o risco pelos “impactos positivos ou negativos decorrentes da implantação de sistema de arrecadação de Tarifa de Pedágio na modalidade free flow, ou outro que venha a existir, inclusive o comprovado aumento de receita e de evasão decorrente da implantação desta modalidade (...)” (Cláusula 22.2.16 do Contrato). E na cláusula 22.1.2, estabelece como risco da Concessionária a “queda de Receita Tarifária em virtude da evasão de pedágio ou de recusa de usuários em pagar a Tarifa de Pedágio ou a Tarifa de Pedágio do Trecho Viúva Graça”.

No contrato da rodovia Piracicaba Panorama S.A. - PIPA[4], no estado de São Paulo, a previsão é semelhante à da BR 101/RJ. Na hipótese de implantação da modalidade de cobrança de tarifa free flow, o risco de evasão fica compartilhado entre o Poder Concedente e a Concessionária. No contexto de São Paulo, embora haja previsões em alguns contratos, o free flow ainda não foi implementado (embora haja um projeto pioneiro e piloto na região de Jaguariúna, denominado “Ponto a Ponto”).

Contratos de concessão de rodovias federais - casos da BR 364/365/GO/MG (Ecovias do Cerrado), BR 101/SC (Via Costeira), BR 153/414/080/TO/GO (Ecovias do Araguaia) - também preveem uma alocação de riscos compartilhada caso haja implantação do sistema free flow.

Por essa amostra e considerando o percentual de evasão de pedágio levantado pela Artesp no ano de 2022, parece pertinente que esse mapeamento realizado pela Agência paulista seja levado em consideração pela ANTT no âmbito da Audiência Pública n. 013/2022, recentemente prorrogada até o dia 31/01/2023.

Como o objetivo da Agência é justamente colher impressões e contribuições para a melhoria e adequação da alocação de riscos dos contratos de concessão de rodovias federais à realidade das situações vivenciadas – em especial, o compartilhamento do risco de demanda – o dado pode contribuir para a pauta ao servir como um norte para o tema, ainda que a partir de uma amostra estadual.

A inclusão de tal elemento no estudo pode repercutir diretamente na metodologia que está sendo pensada e debatida pela ANTT no que tange às bandas de compartilhamento do risco de demanda e, sobretudo, na ampliação da aplicação do uso de sistema free flow.




[1]https://g1-globo-com.cdn.ampproject.org/c/s/g1.globo.com/google/amp/jornal-hoje/noticia/2023/01/13/sp-tem-29-milhoes-de-evasoes-em-pedagios-de-rodovias-concedidas-a-iniciativa-privada-em-2022.ghtml

[2]https://www.gov.br/antt/pt-br/assuntos/ultimas-noticias/antt-e-ccr-riosp-iniciam-a-implantacao-do-primeiro-sistema-free-flow-em-rodovias-federais

[3] Criação de procedimentos para o funcionamento de um sandbox regulatório (ambiente regulatório experimental), em que o regulador pode ousar, errar, testar, rejeitar e reformular hipóteses, ajustar propostas e chegar mais rapidamente a soluções efetivas para os problemas regulatórios.

https://portal.antt.gov.br/resultado/-/asset_publisher/m2By5inRuGGs/content/id/3119150

[4] CLÁUSULA DÉCIMA NONA - ALOCAÇÃO DE RISCOS

DOS RISCOS DA CONCESSIONÁRIA

(...)

19.1. vi. Quedas de RECEITA TARIFÁRIA em virtude da evasão de pedágio, conforme estabelecido no presente CONTRATO, com exceção das hipóteses expressamente previstas;

DOS RISCOS DO PODER CONCEDENTE

19.2. xvi. Investimentos e impactos positivos ou negativos decorrentes da implantação de sistema de arrecadação de TARIFAS DE PEDÁGIO na modalidade FREE FLOW, ou outro que venha a existir;

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