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Região Metropolitana: arena de disputas políticas ou de convergências?

Apresentação de um breve levantamento acerca do alinhamento de Municípios com o Governo do Estado nas votações das instâncias de deliberação metropolitana fluminense.


Isadora Cohen

Carolina Carelli

Matheus Cadedo


Publicado originalmente no JOTA


Quando o assunto é "Região Metropolitana", um tema central que sempre se levanta é o da governança[1]. Qual o formato de interação institucional entre os diversos atores (municípios e Estados) e qual o melhor arranjo para concretização dos interesses coletivos.

No mais das vezes, as deliberações são realizadas em território político. São Prefeitos e Governadores que devem votar os mais diversos temas. E em contextos em que nem sempre os partidos e anseios são alinhados, é possível supor que eventualmente haja dificuldade de aprovação de matérias em razão de divergências não técnicas.

Uma impressão inicial poderia ser a de que entes, cujos representantes máximos do Executivo sustentem ideologias político-partidárias distintas, não teriam interesse no consenso. E que isso, portanto, travaria um processo de tomada de decisão conjunta em âmbito metropolitano.

Em um artigo, nesta Coluna de Infra, apresentamos o funcionamento do Instituto Rio Metrópole, um órgão técnico destinado a executar as ações de governança e desenvolvimento tomadas pelo Conselho Deliberativo da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ)[2]. Utilizamos esse contexto para observar se poderia se sustentar a hipótese de não consenso em função de inclinações políticas. E a resposta foi surpreendente: nas deliberações a respeito de iniciativas e projetos de interesse da Região, as matérias propostas pelo Instituto (Órgão que funciona quase como uma agência do Estado - autarquia especial vinculado ao Governo do Estado) foram aprovadas - as vezes- por unanimidade.

A partir dos vinte e um municípios integrantes da RMRJ, foi identificado um bloco de 9 municípios que integram partidos que se autodenominam de centro-esquerda e esquerda que, em tese, poderiam ter interesses não convergentes com as pautas do Governo do Estado (ao qual o Rio Metrópole é vinculado), exercido pelos dirigentes do Partido Social Cristão (PSC) e Partido Liberal (PL) nos últimos 3 anos[3].

A partir disso foi observado como esses 9 municípios votavam no Conselho Deliberativo da RMRJ, responsável pela tomada de decisão acerca dos projetos e ações metropolitanas. Para tanto, foram consultadas as atas das Reuniões do Conselho Deliberativo que ocorreram entre março de 2019 e dezembro de 2020. Nesse período, ocorreram 8 reuniões do Conselho, das quais em três delas houve matérias submetidas para apreciação e deliberação de seus membros (Prefeitos e Governador).

Os resultados, contudo, indicam que apenas um dos 21 municípios - o do Rio de Janeiro - apresentou uma atuação contrária as propostas apresentadas pelo Instituto ao Conselho Deliberativo. Interessante notar, ainda, que a Prefeitura do Rio era encabeçada por representante do Republicanos, partido político, em tese, ideologicamente compatíveis com o governo estadual, que nomeia os dirigentes do Rio Metrópole.

Outros dois municípios, São Gonçalo e Cachoeira de Macau, tiveram posição pontualmente não convergente com o Instituto (sendo uma abstenção do último). Porém, concordaram com a posição da entidade Estadual nas outras duas votações.

Em suma, os dados, respeitadas as suas limitações, indicam que, no ambiente de decisão metropolitana fluminense, oposições políticas que poderiam ser inferidas em outros campos de debate não se vislumbraram na prática. Algumas hipóteses - que demandam maiores estudos e dados para confirmação - podem ser suscitadas para tal cenário.

Talvez, dada a menor publicidade das decisões tomadas pelas instâncias de deliberação metropolitana, os entes federados, representados por seus atores políticos, se sintam menos constrangidos a se apegar aos posicionamentos oficiais de seus partidos, tomando uma decisão mais aliada com os interesses municipais.

Um fator que pode contribuir para esse cenário talvez seja a atuação, mais técnica, do próprio Instituto Rio Metrópole. O mesmo modela projetos metropolitanos, como a prestação regionalizada de serviços públicos, elabora minutas e documentos, bem com presta apoio técnico ao Conselho Deliberativo. A sua estrutura se aproxima, em partes, com a das Agências reguladoras, tendo diretoria colegiada e com mandato fixo, cujos ocupantes dos cargos devem preencher certos requisitos de formação e experiência profissional, afastando possibilidades de ingerências políticas sobre sua gestão e atuação[4].

Esses fatores podem conferir maior legitimidade técnica aos materiais apresentados aos representantes dos entes metropolitanos no Conselho Deliberativo, fazendo com que Prefeitos tenham uma impressão de neutralidade política que os permita votar em conjunto com o Governo do Estado. Seriam necessários, contudo, estudos mais aprofundados para descobrir as reais motivações que levam ao alinhamento entre municípios e à Agência vinculada ao Governo do Estado.

Em resumo, os dados coletados permitem inferir que a organização dos Prefeitos municipais, no Conselho deliberativo da RMRJ, não se aproxima com aquela lógica de organização partidária em instâncias deliberativas legislativas, como as Assembleias Legislativas e o Congresso Nacional, em que representantes com uma ideologia política mais alinhada formam blocos de oposição que podem votar, reiteradamente, contra o ente governista [5].

Com isso, no caso no Rio de Janeiro, o que vem se verificando na prática é o vislumbre da operacionalidade das estruturas de Governança Metropolitana, revelando importantes convergências na tomada de decisão conjunta, não havendo grandes embates políticos na aprovação de projetos e disposições internas.

As ponderações feitas neste artigo, entretanto, são, apenas, incipientes, havendo grande espaço de inferência para que se façam complementações mais detalhadas e análises mais detidas do tema. No entanto, casos como o da RMRJ podem indicar que as Regiões Metropolitanas, com uma estrutura de governança dotada de entes técnicos e relativamente independentes, podem servir como importantes mecanismos para a superação de disputas políticas e promoção de projetos interfederativos conjuntos, podendo ser foco de análise dos estudiosos no futuro.



Tabela Anexa de Pesquisa


OBS: Em amarelo as cidades que poderiam externar, em tese, uma oposição ao Governado do Estado, dado o partido político ao qual o chefe do executivo é filiado. A reunião de 04/12/2019 tratava da aprovação do Regimento Interno do Conselho Deliberativo e da nomeação de membros para o Conselho Consultivo e Instituto Rio Metrópole. As reuniões de 2020 estavam relacionadas com o projeto de concessão regionalizada dos serviços de tratamento e esgotamento sanitário na RMRJ (Concessão CEDAE).

[1] INFRACAST #79 – Noite adentro com Saneamento: Regionalização do Saneamento. Entrevistados: Flávia Della Coletta Depiné, Alessandra Obara, Camila Rocha Cunha Viana e Inês Santos Coimbra. Entrevistadora: Isadora Cohen. [S. l.]: 06 nov. 2021. Podcast. Disponível em: https://open.spotify.com/episode/5ttSRTiqsIeyjYlW9ahLzo?si=YepfpQ-rSlK3BbjLgIy3Dg [2] https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/infra/regioes-metropolitanas-um-potencial-a-ser-melhor-explorado-08102021 [3] A gestão desses partidos foi responsável pela indicação dos atuais membros do Instituto. [4]Consulte-se a Lei Complementar Estadual nº184/18 d0 Rio de Janeiro. [5] Asseguram-se as ressalvas dessa comparação, dada as menores limitações de um representante do executivo municipal a seguir as orientações de seus partidos políticos, já que os parlamentes estão sujeitos à mecanismos como a fidelidade partidária (cargos não majoritários).

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