Como Mato Grosso pretende usar a inovação como arma competitiva frente à agenda de concessões nas rodovias federais
Por: Caio Albuquerque, Rodrigo Urrutia. Publicado originalmente no JOTA
Dizer que o Brasil é um país de proporções continentais é chover no molhado. Não é nada surpreendente constatar que desenvolver uma malha de transportes rodoviários eficiente e que atenda as demandas de carga e passageiros – e mantê-la em boas condições – é um desafio tão grande quanto o tamanho do país.
Para solucionar tão crítico desafio, o governo se vale da prerrogativa constitucional de conceder à iniciativa privada a manutenção, construção ou ambos de rodovias – e o faz em nível federal, estadual ou municipal. No caso do governo federal, apenas 27 de suas rodovias estão concedidas[1], o que corresponde a 12,8% da malha rodoviária federal[2].
É um percentual baixo para um país que depende esmagadoramente do sistema rodoviário para o transporte de cargas e pessoas. Todavia, a meta do Ministério dos Transportes de realizar 13 licitações em 2024 demonstra que a agenda federal para concessões de rodovias será um tanto ousada[3].
O movimento agressivo do governo federal faz surgir um questionamento importante, um elefante dentro da sala dos governadores de todo o Brasil: frente à agressiva agenda federal de concessões rodoviárias, como os certames de rodovias estaduais poderão ser competitivos?
Considerando que o número de players nacionais e internacionais interessados é limitado, a concorrência dos estados com o governo federal pode se tornar um problema. O Estado de Mato Grosso, entretanto, acredita ter uma saída.
Terceiro maior estado brasileiro em área, maior produtor de grãos do país[4] e maior criador de gado nacional[5], Mato Grosso pode ser considerado como a principal unidade federativa relacionada ao agronegócio – o mais importante setor econômico do país.
Tais credenciais são, por óbvio, um diferencial por si só para a atração de investidores.
Todavia, não é a principal carta na manga do governo mato-grossense.
A principal aposta do governador Mauro Mendes e do titular da pasta de Infraestrutura, Marcelo de Oliveira e Silva, para o ano de 2024 é a inovação. A Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística mato-grossense tem se debruçado sobre soluções contratuais para melhorar a eficiência e a segurança das concessões em diversos aspectos.
Um dos principais aspectos atacados pela Sinfra é a qualidade dos contratos de concessões. Nesse sentido, o Estado tem investido na premissa da procedimentalização contratual, preferindo fixar procedimentos e parâmetros a serem avaliados para o resultado desejado em detrimento de parâmetros rígidos e fixos e que podem não se adaptar às condições de longo prazo.
Uma medida que contribui para a valorização do cenário mato-grossense em potenciais certames licitatórios é a adoção de práticas já consagradas em outros países e estados. É o caso do modelo de matriz de riscos focados em rodovias do Global Infrastructure Hub (GIHUB) e o apontamento de contratos e práticas modernas da Agência de Transportes do Estado de São Paulo (Artesp) como parâmetros para administração de contas e planos de seguros dentro da elaboração dos documentos.
Quanto à tecnologia propriamente dita, a Sinfra pretende adotar em suas concessões a ferramenta do Free Flow – a cobrança eletrônica de pedágio. A ferramenta dispensa as praças de pedágio nas rodovias, diminui congestionamentos por ela causados, economiza tempo dos usuários, previne evasões e pode até ser mais justa, considerando possível cobrança por quilometragem utilizada na rodovia.
Alinhando a tecnologia com o desenvolvimento contratual, é a intenção do Estado já iniciar a modelagem de todos os projetos com a aplicação do Free Flow. Nessa seara, o incentivo e previsão de Sandbox nos contratos também é um pilar para a Sinfra no futuro das concessões mato-grossenses.
Já olhando para a tão requisitada agenda ambiental, o Estado enxerga que os recentes resultados positivos podem atrair investidores.
Estamos falando, aqui, do aumento de mais de 600% em autuações realizadas de forma remota por desmates e crimes ambientais[6] e dos investimentos de mais de 240 milhões de reais desde 2019 em prevenção e combate ao desmatamento e incêndios florestais[7].
Como resultado, o Estado realizou mais de 270 operações deflagradas contra crimes ambientais somente em 2023[8], além de ter aplicado multas bilionárias e ter embargado mais de 280 mil hectares por crimes ambientais.[9].
Essas e outras medidas, além de inovativas, são legítimas e focadas no bem-estar social e no desenvolvimento econômico do Estado. Demonstram preocupação com as dores dos cidadãos usuários das rodovias, da infraestrutura de uma região crítica da economia nacional e da boa utilização do dinheiro público. As medidas tornam, ademais, o ambiente mais seguro para o mercado e confiável do ponto de vista de investimentos.
Seguramente os movimentos realizados pela Sinfra trarão frutos no que tange a competitividade de Mato Grosso frente à robusta agenda de concessões do governo federal, mas mais do que isso, demonstram um bom exemplo de gestão de infraestrutura para o resto do país, o que – novamente chovendo no molhado – é absolutamente necessário.
[1]Disponível em:https://www.gov.br/antt/pt-br/assuntos/rodovias/concessionarias/lista-de-concessoes. Acessado em 04 de abril de 2024.
[2]Disponível em:https://www.gov.br/transportes/pt-br/assuntos/conteudo/rodovias-brasileiras. Acessado em 04 de abril de 2024.
[3]Disponível em:https://www.poder360.com.br/infraestrutura/governo-quer-13-leiloes-de-rodovias-e-14-revisoes-contratuais-em-2024/. Acessado em 04 de abril de 2024.
[4]Disponível em:https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/37894-em-2022-sorriso-mt-manteve-a-lideranca-na-producao-agricola#:~:text=Com%20participa%C3%A7%C3%A3o%20de%2030%2C2,e%20Rio%20Grande%20do%20Sul.&text=Maior%20produtor%20de%20soja%2C%20milho,maior%20valor%20de%20produ%C3%A7%C3%A3o%20agr%C3%ADcola. Acessado em 04 de abril de 2024.
[5]Disponível em:https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/rebanho-bovino-brasileiro-alcancou-recorde-de-234-4-milhoes-de-animais-em-2022#:~:text=Mato%20Grosso%20lidera%20o%20rebanho,2%2C5%20milh%C3%B5es%20de%20cabe%C3%A7as. Acessado em 04 de abril de 2024.
[6]Disponível em:https://www.secom.mt.gov.br/w/mato-grosso-tem-aumento-de-660-nas-autua%C3%A7%C3%B5es-ambientais-com-apoio-de-imagens-de-sat%C3%A9lite-de-alta-resolu%C3%A7%C3%A3o#:~:text=A%20Sema%20promove%20a%20autua%C3%A7%C3%A3o,ainda%20sem%20identifica%C3%A7%C3%A3o%20do%20infrator. Acessado em 04 de abril de 2024.
[7]Disponível em:https://www.secom.mt.gov.br/w/crimes-ambientais-s%C3%A3o-identificados-e-punidos-em-mt-r-1-8-bilh%C3%A3o-em-multas. Acessado em 04 de abril de 2024.
[8]Disponível em:https://www.secom.mt.gov.br/w/sema-mt-realizou-270-opera%C3%A7%C3%B5es-contra-crimes-ambientais-e-desmatamento-ilegal-em-2023#:~:text=Sema%2DMT%20realizou%20270%20opera%C3%A7%C3%B5es,mt.gov.br%20%2D%20Site. Acessado em 04 de abril de 2024.
[9]Disponível em:https://www.secom.mt.gov.br/w/crimes-ambientais-s%C3%A3o-identificados-e-punidos-em-mt-r-1-8-bilh%C3%A3o-em-multas
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